Ricardo Salles e Sergio Moro (Foto: Lula Marques | Alessandro Dantas)

Quando o masoquismo vale a pena

24 de novembro de 2021, 17:56

Um amigo de cinco décadas diz que primeiro se surpreendeu, depois se espantou e passou a se preocupar, com minha capacidade de ser masoquista. Amigos mais recentes, mas ainda assim de décadas, se espantaram e, discretos, não tornaram a fazer comentários.  

Meu filho, ao constatar até que ponto meu masoquismo chegou, disse que eu devia procurar tratamento com urgência.

Estou me referindo ao fato de acompanhar todas ou quase todas as aparições e falas de Jair Messias, e às vezes de alguns integrantes do seu bando. A verdade é que de tanto ouvir asneiras repetidas à exaustão, comecei a relaxar com relação a Jair Messias.  

Tenho cá meus motivos para agir assim: é sempre bom acompanhar de perto os movimentos do inimigo. É sempre importante tratar de medir até que ponto seu desequilíbrio avança, porque com ele avança também a destruição tenebrosa do país.

E, devo confessar: às vezes, o patético chega a ser engraçado.

Pois neste 24 de novembro, e quase por acaso, descobri outra fonte engraçadíssima: Ricardo Salles.

Sim, sim, aquele que foi ministro do Meio Ambiente entre o primeiro dia de 2019 e 23 junho de 2021.  

Nesse período ele demonstrou uma lealdade inabalável às determinações de Jair Messias: sua contribuição para o desastre ambiental que sufoca o Brasil é insuperável.  

Além de permitir – e incentivar de várias maneiras – a devastação das florestas, de abrir porteiras para que garimpeiros invadissem terras demarcadas e espalhassem a desgraça entre as comunidades indígenas, ele se entusiasmou.

E esse entusiasmo acabou sendo a peça-chave para que acabasse caindo fora da cadeira ministerial: denunciado por autoridades dos Estados Unidos (aqui, nem pensar) por estar pelo menos envolvido – há suspeitas de que, na verdade, seja ele o mentor – em esquemas de exportação ilegal de madeira extraída de maneira igualmente ilegal, pediu demissão.

Claro: agora, as investigações correm na Justiça comum, e podem ser encobertas ou atrasadas pelo tempo que for.

Pois bem, voltando ao meu masoquismo: perdi preciosos minutos da minha vida, uns dez ou doze, assistindo na internet a um tumulto sem eixo mas com nome de programa de rádio. Ah, sim, claro, na emissora oficial de Jair Messias, a rádio Jovem Pan.

Pois não é que Ricardo Salles assegurou, sem corar e com todas as letras, que Sergio Moro, além de defender o uso de drogas, é comunista?

Até mesmo seus bizarros acompanhantes, que integram o time do programa, estranharam e contestaram. Chegaram à conclusão que Moro é, isso sim, tucano. O que, para eles, não é a mesma coisa mas dá no mesmo ou quase.

A partir de agora, vou tratar de seguir as falas de Ricardo Salles. Claro que ele é um perigo, e é bem provável que, se a Justiça deixar, acabe sendo eleito deputado ou coisa parecida (o que interessa, claro, é o foro privilegiado). Mas, caramba!, essa capacidade de ridículo merece atenção.

Já ouvi Sergio Moro ser chamado de juiz manipulador para baixo, passando por canalha e tudo que for imaginável.

Mas comunista… acho que nem Jair Messias se atreveria a tanto.

Escrito por:

Eric Nepomuceno é jornalista e escritor

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