Ciro Gomes (Foto: Reprodução)

Ou Ciro troca a camisa e entra em campo, ou vai pendurar as chuteiras sem direito a volta olímpica

11 de setembro de 2022, 19:07

O brasileiro médio não gosta de perder. Nem no jogo de porrinha. Muito menos discussão de bar. Ele quer chegar no boteco, bater no balcão e comemorar a vitória do seu candidato. Um motivo a mais para aquela cervejinha gelada. Aquele brasileiro que não pratica o voto ideológico, fica de olhos atentos nas pesquisas das últimas semanas que antecedem ao pleito, porque a eleição para ele é uma espécie de corrida de cavalos. E quem quer apostar num pangaré, não é mesmo?

Há um certo tempo, o que as aferições vêm mostrando é que 76% dos eleitores já decidiram o seu voto e não pretendem mudá-lo. Aí a notícia carece de exatidão, como naqueles versos.  

 Na última pesquisa Datafolha, um dado chamou a atenção. Não foi a redução da diferença entre Luiz Inácio Lula da Silva (45%) e Bolsonaro (34%) na votação do primeiro turno. O que grita nos números do eleitorado é a volatilidade dos que se dizem propensos a votar no ex-ministro Ciro Gomes.  

Enquanto a certeza é elevada entre os que optam por Lula (83%) e Bolsonaro (84%), há uma fatia maior que admite reconsiderar o voto no pedetista. Importante destacar que o percentual convicto dos eleitores de Ciro cresceu na comparação com agosto. Segundo analistas, uma nuvem passageira, empurrada pelos ventos do debate da TV Bandeirantes, onde a passividade de Lula permitiu que tanto ele quanto a senadora Simone Tebet se sobressaíssem – também o formato do debate o ajudou.

O dado que conta aqui é observar que do contingente de 7% de intenções de votos declarados para Ciro, 42% estão firmes na escolha, mas, destes, 57% disseram poder virar o voto na reta final. É isto. Mais da metade de seus eleitores podem desistir no minuto final. Chegamos ao brasileiro médio que não gosta de perder e vai esperar a última pesquisa para votar no candidato com chances reais de vitória. Contamos com ele? Sim, contamos muito. Mas não só.  

Há os votos dos ciristas ideológicos, os daqueles que leem jornal, acompanham o noticiário, têm instrução e definição política suficiente para saber que, na quinta-feira (08/09), dados do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) atestaram que o índice de Desenvolvimento Humano (IDH) brasileiro ficou em 0,754, apontando um recuo para o Brasil ao patamar de 2014, num retrocesso maior que a média mundial. E, ainda segundo o estudo, o item que derrubou o IDH nacional foi a saúde, demonstrando o desleixo do governo com a vida dos brasileiros durante a pandemia (mais de 680 mil mortes), bem como o da educação, estagnado.  

O eleitorado de Ciro sabe que existem 33 milhões passando fome no país e identifica perfeitamente em Bolsonaro e em seu desgoverno, o motivo para tanta desgraça num só momento. Revolta-se com imagens de um bolsonarista regateando uma marmita de comida para a família de uma lulista, tentando trocá-la por voto e a ameaça de deixá-la com fome porque ela não cede. Nesta hora, em que as urnas se abrem e os faz pensar, não é difícil imaginar que os dedos tendem a escorregar e dedilhar 13, ao som do priimmm de finalização do voto. A consciência vai doer. O medo de ter Bolsonaro de novo, gritando para uma massaroca de fanáticos que é “imbrochável” vai levá-los ao voto em Lula.  

É bem verdade que se antes 35% se declaravam plenamente decididos a votarem no ex-ministro, agora são 42%. Porém, a taxa dos que podem migrar para outro candidato está em 57%. Ou seja, em um minuto, ali, no isolamento da cabine, há a chance de mais da metade do eleitorado de Ciro bater asas rumo à estrela do PT.  

Ciro, por sua vez – que chegou a fazer rapapés para Bolsonaro -, provou neste sábado (10/09), do perigo que pode ser se embrenhar no pântano bolsonarista, a continuar nessa trilha. Enquanto ataca diuturnamente o ex-presidente Lula, os bolsominions assanhados o agridem, pois acham feio tudo o que não é espelho.

Mas feio mesmo será Ciro dar as costas para o perigo, armazenando no fígado a bile produzida em 2018, quando Lula o chamou para uma conversa na prisão, enquanto o seu destino político continuava indefinido. Seria de Ciro o lugar oferecido depois a Haddad, e talvez com maior chance de vitória do campo progressista, pois seu nome era mais conhecido. Num ataque de egocentrismo, preferiu interpretar como afronta, o que seria um pedido legítimo para salvar o Brasil. Ciro achou ofensivo sentar-se no banco de reserva de Lula e esperar a decisão da Justiça, até ser colocado em seu lugar para a disputa. Não entendeu nada do jogo, assim como demonstra agora que é nulo em estratégia. Ou Ciro vai para o vestiário, troca a camisa e entra em campo, ou vai pendurar a chuteira sem direito a volta olímpica. Melancolicamente.

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Escrito por:

Jornalista. Passou pelos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora-pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" e "Imaculada", membro do Jornalistas pela Democracia

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