O vale-quanto-pesa de Bolsonaro no pós-TSE
O julgamento do TSE que deve condenar Jair Bolsonaro à inelegibilidade será um ato histórico, um legado a ensinar às novas gerações que atentar contra a democracia é crime. Na atual conjuntura, porém, virou um anticlímax, crônica de uma inelegibilidade anunciada que já transportou os interessados à etapa seguinte, a divisão do espólio de Bolsonaro. Divisão? Aí é que está. O ex-presidente e seus aliados do PL sabem que, para valer nas eleições que vêm por aí, a herança não pode se fragmentar entre diversas forças. A direita saiu da caixa de maldades aberta por Bolsonaro em sua eleição e é um dado concreto — mas vai precisar de novo pólo aglutinador.
Jair Bolsonaro não atraiu multidões em sua defesa, não mobilizou políticos importantes para protestar contra o TSE e sabe que são fingidos os gestos de solidariedade de boa parte dos aliados. Estão de olho no espólio, e a integridade do legado vai depender muito de sua capacidade de manter agregado aquele percentual de eleitores que, mostram as pesquisas, ainda está com ele para o que der e vier — algo em torno de 15% a 20%.
O bolsonarismo ainda tem uma fatia e tanto das preferências, mas seu líder vai entrar agora numa espécie de vale-quanto-pesa político: seu futuro está diretamente ligado à sua competência para manter seus seguidores juntos e animados. Daí a estratégia da vitimização do ex-presidente, já em curso, mas que deve ser potencializada a partir do fim do julgamento.
O problema é que, sozinho, um Bolsonaro não faz verão. Vai precisar de mídia, espaço nas redes, apoio político para que tenha visibilidade aonde chegar, país afora, com seu discurso de vítima do sistema. Mais do que nunca, vai precisar dos recursos financeiros do PL de Valdemar Costa Neto, de quem vai se tornar uma espécie de refém, a cada dia mais.
Entre políticos ligados ao ex-presidente, inclusive Valdemar, há um discurso uníssono de que Bolsonaro será um grande cabo eleitoral em 2024 e em 2026. Com certeza, se mantidas as atuais condições temperatura e pressão e se, acima de tudo, a direita brasileira — radical e moderada — marchar unida. Isso inclui, além do bolsonarismo, seus filhotes mais promissores, como o governador Tarcísio de Freitas, e outros personagens, como o mineiro Romeu Zema, o gaúcho Eduardo Leite, o paranaense Ratinho e demais nomes. No plano partidário, manter juntos PL, PP, Republicanos, etc.
Na visão dos estrategistas de direita, alguns desses candidatos em potencial, juntando-se à fatia bolsonarista, poderão agregar à chapa de 2026 as forças de centro que Bolsonaro espantou em 2022 e, quem sabe, derrotar Lula ou seu candidato do espectro de centro-esquerda. Por enquanto, isso é um devaneio. Antes de arriscar passo maior, Tarcísio, por exemplo, tem que governar São Paulo — e bem. De outro lado, o governo de Lula, ultimamente bafejado por bons ventos na economia, teria que resultar num grande fracasso para perder as condições de reeleição ou eleição de um sucessor.
O que o dia seguinte à inelegibilidade deve mostrar a Bolsonaro, porém, é que seus problemas, antes de tudo, estão em casa. Quem conhece Bolsonaro, Valdemar e a infinidade de políticos que hoje integram a recém-nascida direita brasileira sabe que, nessa turma, não há cavalheirismos. Vale a lei do mais esperto e do salve-se quem puder, sob a qual cada um corre atrás de seu naco dos despojos políticos de quem sai de cena. Rei morto, rei posto — e há quem aposte que o ex-presidente e o presidente do PL estarão às turras em poucas semanas.