O Populismo do Bolsonaro

17 de agosto de 2020, 14:14

Se não conseguirem tirar o Bolsonaro por impeachment, e está me parecendo difícil pela resistência dos próprios políticos e da elite, vamos ter que engolir um segundo mandato dele, muito provavelmente. 

Bolsonaro se criou na mentira, se aproveitando da ingenuidade de quem votou nele, de quem votou em branco ou nulo e da ingenuidade da esquerda também que jamais imaginou que ele pudesse vencer. O PT acabou vítima de sua própria grandeza e, como sempre, não fez o jogo sujo da direita para ganhar a eleição a todo custo. Bolsonaro não sabe o que quer por isso mente. Não sabe o que dizer, por isso mente. Não sabe governar, por isso mente e se aproveitando não só de quem está com ele como de quem fornece fatos para ele se apoderar. O auxílio emergencial foi uma deles. Era contra e hoje pega carona no grande efeito que causa nas populações mais pobres. E o povo acredita que foi ele. 

Ele vai mentindo por que os mentirosos tem charme, segundo o jornalista Vitor Paiva. A mentira se apodera de tudo que é vantajoso porque não tem que ser verdadeira, justamente. Como uma bela história de ficção ou uma novela de televisão que consulta o povo pelas pesquisas para saber para onde ir. É mais ou menos isso. Bolsonaro ficou enfeitiçado com o populismo que conquistou e não vai mais largar o osso. Guedes se incomoda. Mesmo incompetente, sua política neoliberal não prevê esses arroubos populares e generosos do presidente. Para ele essas benesses só atrapalham o programa. Ele quer, como sempre, dar dinheiro a quem já tem com a velha desculpa que a retomada vai gerar mais emprego, sem carteira e sem direitos, é bom lembrar. Mas não é isso que atrai votos e Bolsonaro sonha todas as noites com esse votos chovendo sobre o Alvorada como notas de dólares que um assaltante resolve distribuir a esmo numa fuga desenfreada.

Bolsonaro gostou de subir nas pesquisas. Quem não gosta? E principalmente, o povo gosta de melhorar de vida. Quando Lula foi eleito o Brasil vinha de um período de centro direita quase neoliberal que de popular só tinha a música. O PSDB e o PMDB fizeram um governo de elite para a elite com algumas reformas que trouxeram a ilusão de que o Brasil podia tomar jeito. Mas o povo foi deixado de lado. Para Lula e o PT foi difícil mas depois de duas eleições perdidas conseguiu fazer o povo  perceber de onde viria de fato alguma coisa a seu favor. Dai a história nos mostra o que aconteceu. O povo realmente foi beneficiado.

Hoje, depois de todas as articulações golpistas para tirar o PT ou qualquer governo de esquerda do poder, a mentira passou a ser a grande arma. A Lava Jato foi derrubando, através das mentiras e dos crimes cometidos, qualquer possibilidade de estabilização dos governos mais populares no poder. A denúncia falsa de Palocci às vésperas da eleição mostra isso. Foi o golpe de misericórdia na sobrevivência do candidato de esquerda. Lula foi tirado antes da disputa numa enxurrada de acusações que acabaram não se concretizando e hoje, o que resta da esquerda, são fragmentos de um discurso popular que tem que ser reescrito.

Bolsonaro, como todo mentiroso, e ainda segundo Vitor Paiva, é fascinante, Suas palhaçadas, suas estrepolias, seu deboche e mesmo seu fascismo vão de encontro ao que o povo curte. Se distribuir alguma coisa então, fica imbatível. Só que para isso precisa de dinheiro ou de coragem política para tirar de onde está sobrando, taxar grandes fortunas ou redistribuir a renda. Mas isso ele não fará. O PT poderia fazer se tivesse tido mais tempo. Alianças espúrias ou duvidosas são necessárias para se governar na democracia. O PT foi moralista e que bom que foi. Respeitou republicanamente as regras. Se mentiu, mentiu pouco e hoje, com tudo o que está acontecendo, o que o povo quer é uma novela da televisão com um enredo dos sonhos escritos por eles mesmo e cheio de ilusões. 

Ilusão é bom. Ilusão faz você sair de casa sem máscara achando que a pandemia acabou. Ilusão aliada ao fanatismo religioso então, é melhor ainda. Faz você achar mais grave um aborto numa menina violentada aos 10 anos do que o próprio estupro. Nada melhor que um bom pai do povo para guiar essa população sem escola, sem saúde, sem moradia e sem trabalho. 

A cultura, totalmente soterrada, sobreviverá para um dia contar essa história a quem viveu, a quem não viu e a quem ainda não nasceu. Assim é a História. Leva tempo pra ser escrita e muito mais tempo para ser vivida. Ou a esquerda muda o discurso e passa a se articular sem ilusões, no mundo da política brasileira, indo para as ruas quando der e indo para a mesa da negociação quando se dispuser, ou vamos ver vários Bolsonaros no poder.

Escrito por:

Cartunista, diretor de arte e ilustrador além de jornalista, comentarista e autor de teatro, cinema e televisão.

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