Presidente Luiz Inácio Lula da Silva (Foto: REUTERS/Ueslei Marcelino)

O melhor Lula dos 3 mandatos salva a esquerda brasileira. Até quando?

18 de outubro de 2023, 18:16

Na última segunda-feira, durante uma reunião com todo o núcleo político de seu Governo (nele incluídos os líderes no Congresso), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva baixou determinações e orientações sobre como os aliados deveriam se portar e se posicionar publicamente na CPMI do Golpe cujo relatório final seria apresentado no dia seguinte. Ao longo do fim de semana ele recebeu informações de um amigo, que não está nem no Governo, nem no Congresso, acerca do rumo da disputa política interna na Comissão e dos humores dos comandantes militares. Ao ouvir os ministros e os parlamentares que falam por sua equipe tanto na Câmara quanto no Senado, Lula percebeu que o interlocutor hebdomadário (em quem confia bastante, sobretudo na solução de querelas comezinhas da vida parlamentar) tinha informações melhores e mais precisas acerca dos cenários possíveis que adviriam da leitura do relatório final das investigações apresentado pela senadora Eliziane Gama (PSD-MA). Constatado o gap informativo do time palaciano, o presidente deu o rumo a ser seguido por todos, sem abrir negociações. O resultado foi colhido na quarta-feira seguinte (18/10): o consistente relatório da senadora maranhense foi aprovado por 20 votos a favor. A oposição colheu esquálidos 11 votos a um texto esdrúxulo e alternativo, redigido no lisérgico universo paralelo de bolsonaristas golpistas. Agora, o Ministério público Federal, o Ministério Público Militar, o Supremo Tribunal Federal, o Superior Tribunal de Justiça, a Controladoria Geral da União, a Advocacia Geral da União e o Tribunal de Contas da União receberão os indiciamentos, as conclusões e o extrato das investigações da CPMI e deverão acelerar e dar curso àquilo que já está sendo feito pelo STF no âmbito das ações penais abertas e conduzidas pelo ministro Alexandre de Moraes e a fim de apurar responsabilidades e açulamentos de quem participou ou comandou o golpe de 8 de janeiro de 2023 por meio de atos e de omissões. Show de bola de um presidente que se porta como o lendário capitão uruguaio Obdulio Varela na liderança daquele escrete memorável que conquistou a Copa de 1950 em pleno Maracanã e silenciou uma Nação inteira.

O Lula do 3º mandato é mais direto, mais pragmático, mais silencioso e mais ansioso por resultados do que ele mesmo no período 2003-2010, quando exerceu a Presidência da República pela primeira vez. Um extrato do que há de melhor nessa versão 3.0 do presidente brasileiro foi visto em atividade por quem teve o privilégio de estar com ele nesse período de recuperação da cirurgia de quadril à qual foi submetido. O chanceler Mauro Vieira e o assessor especial e ex-ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, podem dar o testemunho do azougue que é o chefe e amigo de ambos. O presidente acompanhou de dentro todas as reuniões decisivas da diplomacia brasileira – inclusive aquelas de nossa representação na Organização das Nações Unidas, cujo Conselho de Segurança tem sido transitoriamente presidido pelo Brasil durante a escalada crescente do conflito israelo-palestino (ou israelo-árabe depois do ataque ao Hospital Batista em Gaza) no Oriente Médio. Todas as bem pensadas e sopesadas palavras dos comunicados oficiais do Itamaraty, do gabinete presidencial e dele mesmo foram lidas e relidas com lupa por um Lula cioso da impossibilidade de errar por exageros retóricos ou mesmo por omissões decorrentes de alianças e simpatias pretéritas. Foi por isso que o Governo não embarcou na tentação de fechar com a politização grotesca do início do conflito, o que apequenava e regionalizava no prisma tosco local a dimensão da tragédia humana ora em curso no território hoje ocupado por Israel. A maturidade da postura adotada por Lula ditou a mudança de rumo da prosa infernalmente pueril da esquerda nacional e fez o mundo perceber de vez que o Brasil está sob outro comando – qualitativo, construtivo – em todos os macrotemas da cena política internacional.

É ao mesmo tempo satisfatório e angustiante assistir à espreita, pelas frestas dos relatos de quem despachou no Palácio da Alvorada nos últimos dias e é frequentador bissexto do Palácio do Planalto nos últimos meses, a forma consistente como o Luiz Inácio Lula da Silva de 2023 exerce o poder num País cujas ruínas recebeu de um antecessor desqualificado que aviltou a Presidência e a República. A satisfação advém de perceber quão melhor é a atual versão do presidente e ex-sindicalista. A angústia é sabê-lo tão solitário nos desvãos do Palácios, nos porões e becos da Praça dos Três Poderes e no território aridamente conflagrado em que se converteram o PT e as demais siglas de esquerda que até hoje não conseguiram forjar uma alternativa consensual que não destrua seu legado e o suceda nos próximos anos. 

Escrito por:

Jornalista

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