O beco sem saída de Bolsonaro
Bolsonaro, além do vocabulário paupérrimo, da indigência intelectual, tem revelado uma dificuldade imensa na compreensão da realidade que o cerca. São vários os exemplos.
Um deles aconteceu na avenida Paulista, no 7 de setembro de 2021 quando, empolgado com a multidão, Bolsonaro acreditou ter encarnado o ‘Duce” italiano do século passado e que, investido em poderes absolutos, poderia emparedar o ministro do STF, Alexandre de Moraes. Poucas horas depois, o “mito” caiu na real, se apavorou, enfiou o rabo entre as pernas e pediu desculpas ao Ministro que ofendeu.
Pouco antes da eleição de 2022, em reunião ministerial, Bolsonaro mais uma vez se afasta da realidade e enfia o pé na jaca, tentando convencer seus ministros a se empenharem no que ele classificou de ‘plano B’: uma ação golpista para impedir a vitória de Lula nas urnas. As frases são as melhores: “Todos aqui temos ‘inteligência bem acima da média” (riam, leitores, riam!). “Todos aqui, como todo mundo ali fora, têm algo a perder. Não podemos, pessoal, deixar chegar as eleições e acontecer; o que está pintado, está pintado”, disse Bolsonaro.
A última bravata ocorreu no dia 12 de fevereiro, segunda-feira de Carnaval, em Brasília. Às 22 horas, o ex-presidente entra na embaixada da Hungria onde pernoita por dois dias. Estava clara a intenção de Bolsonaro em pedir asilo, se furtando ao cumprimento das penas que resultarão das condenações que se avizinham. A nota publicada pelos advogados de Bolsonaro mais parece um conto da carochinha. Acreditar que Bolsonaro, que nunca foi muito dado ao trabalho, em pleno feriado de carnaval, esteve dias e noites discutindo questões políticas brasileiras e húngaras, é exigir de qualquer um de nós uma credulidade quase mítica (sem trocadilho). Certamente também não foi para ensaiar coreografia de bloquinho de carnaval fascistóide com o “irmão” Viktor Orbán.
O fato é que as desculpas para tentar justificar a presença do ex-presidente na embaixada não convenceram ninguém, muito menos a Polícia Federal, que classificou a nota como sendo, ‘risível e patética’. Toda essa história tosca e constrangedora, bem ao estilo de Bolsonaro, revela que Lula tem razão quando diz que Bolsonaro é um ‘covardão’. E também que Bolsonaro está com muito medo da prisão. Ao correr para a embaixada da Hungria, Bolsonaro mostrou o estado de isolamento internacional em que se encontra. Qual outro país aceitaria hoje dar asilo ao presidente que pretendia dar um golpe de estado no Brasil? Bolsonaro é tóxico, até mesmo para os ultradireitistas.
A ideia de fuga não é novidade. Já tinha ficado clara quando ele viajou para os EUA, levando joias e dinheiro suficientes para passar uma boa temporada fora do Brasil. Com dezenas de investigações de crimes cometidos durante a sua gestão, Bolsonaro não se cansa de dizer para os que convivem com ele que jamais será preso. Ou seja, sabe que cometeu crimes, mas sequer cogita provar sua inocência (que sabe não ter). Não pretende pagar por seus crimes.
O céu não está “de brigadeiro” para o ex-presidente golpista. A cadeia está cada vez mais próxima em seu horizonte. E não será a primeira vez. A primeira foi em 1986, quando pegou 15 dias de prisão por ter liderado um movimento por reajuste nos soldos da tropa. Um ano após a prisão, veio o plano “Beco Sem Saída”, que pretendia explodir bombas em quartéis e outras unidades militares no Rio de Janeiro. O caso foi investigado e julgado por uma comissão do Exército, que decidiu, por unanimidade, pela expulsão de Bolsonaro dos quadros militares. Colegas com mais patentes mexeram os pauzinhos e conseguiram que o Superior Tribunal Militar (STM), em uma sessão secreta de quase dez horas, chegasse à conclusão de que as provas eram insuficientes, substituindo a expulsão pela reserva remunerada.
A Polícia Federal pretende concluir o relatório que deve incriminar Bolsonaro até julho deste ano. O ex-presidente será julgado por crimes como golpe de Estado e abolição violenta do Estado democrático de direito, com penas que podem chegar a 12 anos de prisão.
Até lá, é indispensável que haja um acompanhamento próximo do ex-presidente, seja para evitar que ele se perca em um dos passeios de jet-ski, seja para que não entre – por descuido, em alguma embaixada de Brasília.
A ver se não seremos surpreendidos com outras notícias trágico-burlescas, ao modo das “noites húngaras”, com direito a pizza e travesseirinho.