Não perdemos a Copa América. Bolsonaro e a Seleção é que perderam o bonde da História
Não é difícil entender porque tanta gente deixou de torcer pela Seleção Brasileira e muitos até vibraram com a vitória da Argentina, campeã da Copa América. E o motivo é simples. Como poucas vezes na história da Canarinha, dentro de um governo (pelo menos literalmente) civil, o escrete disputou uma competição tão alheia aos interesses do torcedor comum e tão ligada à filosofia genocida e irresponsável de um governo que, por desdita nacional, ocupa o Planalto e desmanda na Nação.
A Copa América veio para o Brasil empurrada pela Federação Sul-americana e acalentada pelo governo brasileiro que, equivocado como sempre, viu no torneio um pé para melhorar a popularidade e se tornar herói do povo. Conversa mole. A competição, rejeitada pela própria Argentina e pela Colômbia, foi gulosamente reivindicada pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF), com as bênçãos de um governo impopular e falido politicamente, embora, na época, ainda não mergulhado no mar de lama de uma corrupção erguida sobre a compra de vacinas que serviriam para evitar, pelo menos, um terço das mortes por Covid-19 no país.
Estava tudo pronto para Bolsonaro aproveitar a “conquista histórica” e faturar politicamente. Só que nem ele imaginaria o furacão que começou a rodopiar sobre sua cabeça a partir das denúncias irrespondíveis trazidas à baila pela CPI da Pandemia. O clima pesou. E o presidente acabou não pisando no Maracanã para ver a final, preferindo dedicar o seu sábado a desfilar com o seu insano rebanho motociclístico a centenas de quilômetros adiante do Maracanã.
Sobre a Seleção, houve até uma quase reação dos jogadores, que ameaçaram não disputar os jogos, alegando razões diversas, inclusive humanitárias, em alguns casos. Fogo de palha, a reação acabou não contagiando o conjunto dos atletas, em boa parte bolsonaristas e movidos basicamente por interesses financeiros. Com a recuada no que poderia tê-lo transformado em símbolo popular, o time voltou a se reduzir ao patamar de burocracia e mediocridade que caracteriza o futebol da insípida “era Tite”. Sem a causa nobre ensaiada, mas logo abandonada, não dava pra torcer por aquilo. O “onze” que já foi a paixão dos brasileiros e a pátria de chuteiras e não é mais. Não, se for apenas pelo futebol xoxo que joga.
A Copa da Comebol, açambarcada pela CBF e bancada pelo bolsonarismo, foi o que se esperava, um fracasso rotundo e ululante – na expressão, um “Salve!” respeitoso a Leonel Brizola e a Nelson Rodrigues, cada qual do seu quadrado ideológico. Tudo nessa competição teve o viés bolsonarista. A começar pela emissora que a transmitiu, um dos braços do “mito” na mídia, a ponto de veicular em sua programação salmos orientando seus telespectadores a não criticarem, “nem de longe” o governo federal.
Aos poucos, até os patrocinadores históricos dos jogos da Seleção foram vendo a barca furada em que se meteram e trataram de cair fora. Exemplo de uma das maiores operadoras de cartão de crédito do país, que não quis vincular seu nome a uma competição que se consolidou em detrimento de meio milhão de mortes por Covid-19. Acabou sobrando para a Copa América o patrocínio de empresas e empresários que já emprestam mesmo o seu beneplácito ideológico ao presidente da República. Foi o caso do “velho da Havan” e de uma rede nacional de hamburguerias. Junto com a CSN, entraram nessa, talvez, até por apoio político do que, propriamente, por questão financeira.
O gol de Di Maria levou a Copa América para Buenos Aires e repôs as coisas em seu devido lugar. O time não merecia ganhar e a Copa sequer devia ter sido realizada. Copa que foi bancada para ser, unicamente, peça de propaganda de um governo que cai de podre. Portanto, não perdemos nada. Não era sobre futebol.