
Intriga desvendada na CPI entre generais de 4 estrelas reverbera nas fileiras
Em meio ao seu depoimento na CPMI dos atos golpistas de 8 de janeiro, na terça-feira (26/09), o general da reserva, Augusto Heleno, depondo na condição de testemunha, deixou transparecer uma tremenda futrica, entre ele e o atual titular do Gabinete de Segurança Institucional, (GSI), o general Marcos Amaro. Virou assunto em um informativo voltado para os temas militares.
Mas cá para nós, contem uma novidade. Desde que o mundo é mundo, o meio militar se bica e se confronta em grupelhos. Basta lembrar a briga histórica entre Mário Andreazza – o ex-ministro dos Transportes dos períodos dos ditadores Costa e Silva e Médici -, versus o general Golbery do Couto e Silva, ex-chefe da Casa Civil dos ditadores Ernesto Geisel e João Figueiredo, e causador de sua demissão do governo.
Em resposta à “perseguição”, Golbery foi alvo de uma carta desaforada, lhe enviada pelo ex-ministro, após Andrezza deixar o governo. Para barrá-lo na eleição do colégio Eleitoral que escolheu Tancredo Neves, Golbery se uniu ao ex-governador Paulo Maluf. Era luta encarniçada. Na mesma medida, Olympio Mourão Filho, o general do golpe de 1964, fustigava o ex-ditador que legou ao país o Ato Institucional nº 5 (AI-5), Costa e Silva, Ato assinado, aliás, também por Andreazza.
Passou batido, mas no depoimento de Heleno, um dos pontos que mais chamou a atenção entre os militares foi a revelação de uma treta entre generais de 4 estrelas, protagonizada pelo general. Augusto Heleno, que comandou o GSI durante o governo Bolsonaro, respondeu a várias questões – e silenciou outras tantas -, e em um momento lamentou declarações feitas à Folha de São Paulo por seu sucessor na pasta, o general de Exército Marcos Antônio Amaro.
Ele afirmou que, apesar de considerar Amaro seu “amigo particular”, ele “falou bobagem. Ele já tinha trabalhado no GSI antes e falou essa bobagem no dia em que chegou no GSI. Eu garanto, tenho certeza absoluta de que ele hoje está arrependido do que falou”, declarou ao microfone da CPMI.
Militar ouvido pelo informativo, sobre o tema, revelou que: “evidentemente a intriga entre Heleno e Amaro é gigantesca, a posição no espectro político do chefe de cada um já é evidência disso… Mas, ambos fizeram parte do Alto Comando, eles têm um código de honra, dividem segredos, é uma espécie de maçonaria militar e a ética manda que Heleno, mais velho, mais antigo, coloque panos quentes sobre isso … os dois sabem que ao dar corda para essa desavença quem vai sair perdendo será a instituição Exército Brasileiro”. A observação tende a cair no vazio, pois o que menos esses generais que foram compor o governo Bolsonaro se importaram foi com a imagem da instituição.
Em sua fala, Heleno deixou escapar: “Sobre a declaração do atual Ministro do GSI, de que eu arranhei a institucionalidade do GSI politizando o gabinete, eu lamento que tenha partido do atual, que é meu amigo particular, um brilhante oficial. Ele já tinha trabalhado no GSI antes e falou essa bobagem no dia em que chegou no GSI. Eu garanto, tenho certeza absoluta de que ele hoje está arrependido do que falou, que o GSI não tem nenhum traço político. Vários dos senhores Parlamentares já foram ao GSI pra tratar de algum assunto e garanto que jamais perceberam qualquer sinal de politização do GSI. O GSI é uma instituição de Estado.”
As declarações a que Heleno se referia foram feitas pelo general Amaro e incluíam observações sobre a conduta e o papel de Heleno no Gabinete de Segurança Institucional (GSI). Amaro disse que o general Heleno, que chegou com uma grande carga política, desconstruiu a institucionalidade do GSI:
“Só ver a galeria de fotografias que você tem ali (dos ministros do GSI). Qual é o primeiro que está usando traje civil ali? (Heleno). Sempre veio para cá um general da ativa, quatro estrelas, para comandar o Gabinete de Segurança Institucional. Desde que se criou o GSI, primeiro foi o general (Jorge) Felix, depois o general Elito (Siqueira). Todos vieram para cá com quatro estrelas, entendendo, fardado, um papel institucional de militar que vai chefiar o GSI. O general Heleno já estava há dez anos fora. Quando veio para cá, já veio com essa carga política, já tinha feito campanha para Bolsonaro. Ou seja, ele veio realmente já assim desconstruindo um pouco essa institucionalidade que tem o GSI”, menosprezou o general Amaro.
É claro que as falas do atual chefe do GSI põe mais lenha na fogueira das suspeitas que recaem sobre Augusto Heleno, de que atuou além dos limites do permitido para conservar o antigo chefe no poder. E ele acusou a estocada.
Heleno pinçou também da Internet, uma declaração que circula nas redes sobre a presença do “DNA bolsonarista” no GSI. Irritado, repetiu a frase: “No GSI permaneceu o DNA bolsonarista do General Heleno”.
E emendou: “Essa foi uma frase infeliz pronunciada eu nem sei por quem, algum jornal que publicou. Não ficou DNA bolsonarista do General Heleno porque eu jamais tratei de política com os meus servidores. Tem aqui alguém que pode testemunhar isso. O Deputado Delegado Federal Dr. Ramagem foi Diretor da Abin durante algum tempo. Por dois anos, não é, Ramagem?” – referindo-se ao ex-diretor da PF, na plateia da CPMI, na condição de deputado federal, aguardando a vez de cantar loas ao general.
As revelações extravasadas por Heleno, na CPI dos atos antidemocráticos, deixam transparecer que as divergências e tensões entre membros de alto escalão do Exército Brasileiro se perpetuam. Ainda que em entrevista veiculada, hoje, o comandante Tomás Paiva tenha saído em socorro de Marcos Freire Gomes, livrando-o de qualquer atitude suspeita que o ligue ao bolsonarismo. Também fez a defesa do ex-comandante da Marinha, o almirante Garnier, arma que sempre esteve distante do Exército, num eterno estranhamento. A impressão que se tem é a de que há um grande esforço para dissipar qualquer dúvida sobre a atuação e à institucionalidade do Exército e de suas instituições associadas. O comandante tem se esmerado em fazer crer que o “time” dos que acreditam que o Exército Brasileiro deveria se abster do tão evocado papel de “moderador” venceu. A conferir.