Luiz Inácio Lula da Silva (Foto: Ricardo Stuckert)

Com um pé em cada canoa, PP e Republicanos preparam desembarque do bolsonarismo

28 de agosto de 2023, 11:26

Lula cozinhou sua reforma ministerial por quase três meses e agora alguns dizem que perdeu o timing e terá que ceder mais do que precisava antes. O Centrão saiu da fase de bonzinho marcada pela aprovação da reforma tributária e pela troca dos membros da CPI do MST para esvaziar a maioria bolsonarista e agora ameaça desfazer a manobra. As pontas deixadas pela aprovação final do arcabouço fiscal, com a transferência do crédito extraordinário de mais de R$ 30 bilhões para futura votação na LDO, fazem parte do rol da chantagem. E ainda temos o Orçamento/2024 e a segunda parte da reforma tributária pela frente, além de outras matérias de interesse do Planalto. Que canseira. No final, tudo se ajeita.

Antes de qualquer coisa, porque PP e Republicanos estão acompanhando as mudanças num cenário em que Lula se fortalece e fica mais popular — e que, em contrapartida, Jair Bolsonaro e seus seguidores, até ontem os aliados preferenciais dessa turma, vão entrando numa espiral de desgraça. 

Lula demora e regateia na entrega dos ministérios pedidos por essas legendas porque sabe também, de antemão, que seus dirigentes não vão entregar a mercadoria completa. É da natureza do PP e do Republicanos acender velas a santos diferentes na mesma missa. Nem num caso, nem noutro, vão aderir formalmente à base do governo ou marchar unidos para o Planalto. Com os ministérios, devem dar a maioria dos votos na Câmara — hoje o PP tem 49 deputados e o Republicanos conta com 41. Se, juntos, derem algo entre 60 e 70 votos ao governo, este já terá maioria folgada na Casa.

É por aí que Lula não tem pressa, e nem obrigação de dar a principal joia da coroa que o PP pede, o MDS, que cuida do Bolsa Família, ao líder André Fufuca. Afinal, o presidente do partido, o bolsonarista Ciro Nogueira, continua batendo no governo dia sim, outro também. Não merece nem de longe levar como prêmio a cabeça de Wellington Dias, seu principal adversário no Piauí — de quem, aliás, tomou tremenda surra em 2022. Não há qualquer sentido nessa operação, e Lula vai mostrar isso na quinta-feira, quando irá ao estado, com Dias, lançar o Brasil sem Fome. 

Mas o PP vai entrar no governo, sim, sem hesitação ou constrangimento, levando Ciência e Tecnologia, Microempresa ou outra pasta. Ser governo é da natureza do partido de Arthur Lira, que já levou a promessa de nomear presidente da CEF a ex-deputada Margarete Coelho (PP-PI) e 12 diretorias e vice-presidências para o centrão — o que vale mais em termos de orçamento e capilaridade do que a maioria dos ministérios.

O Republicanos, partido do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, funciona mais ou menos da mesma forma que o PP. Já levou a promessa de Portos e Aeroportos para o deputado Sylvio Costa Filho e não vai reclamar — e nem aderir oficialmente ao governo.  Ardilosamente, Lula está destinando ao partido o ministério que controla o porto de Santos, estrutura que faz o governador de São Paulo salivar, até para comandar um processo de privatização com o qual o atual ministro, Marcio França, não concordou. Isso deve ajudar o Republicanos a evitar a debandada de Tarcísio da legenda, apesar da pressão do bolsonarismo.

Contas feitas, noves fora, teremos mais alguns frankensteins políticos. O Planalto terá o apoio parlamentar de dois partidos do espectro bolsonarista cujas cabeças ainda raciocinam — ou fingem fazê-lo — segundo os cânones da direita, que em tese terá um candidato para assumir o legado do ex-presidente inelegível. Quem sabe até o governador de São Paulo. 

Mas aí é que está o salto triplo carpado de Lula: ao puxar PP e Republicanos para dentro de casa, oferecendo-lhes abrigo em cargos federais e farta alimentação em verbas e emendas, o presidente petista poderá despertar neles, gordos e satisfeitos, relutância em sair da casa do governo e voltar à embarcação precária do bolsonarismo em 2026. Isso vai depender do grau de aprovação de Lula e de outros fatores. Mas a estratégia desses partidos de passar a ter desde já um pé em cada canoa diz muito.

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