As muitas armas da extrema-direita
Governar o país depois da terra arrasada deixada pela dupla Temer/Bolsonaro não tem sido uma tarefa fácil. Que o diga o presidente Lula, forçado a empenhar toda a sua expertise política e liderança para avançar em pautas importantes para o desenvolvimento do país. Não tem sido fácil para o presidente negociar com um Congresso hostil, uma Justiça titubeante e em meio a toda sorte de pressões de grupos políticos que vão desde o agronegócio, bancada da bala, até as igrejas dos chamados mercadores da fé.
Não à toa, é nas políticas públicas voltadas para as áreas de educação e segurança pública que se observa maior dificuldade de implementação nas esferas estadual e municipal.
Imenso desafio tem sido desfazer as políticas negacionistas e armamentistas implementadas por governantes belicistas. A liberação irresponsável e indiscriminada da comercialização de armas e munições durante a presidência de Jair Bolsonaro continua fazendo vítimas fatais, dia sim e dia também.
Nos quatro anos de desgoverno, foram vendidos aos civis mais de 904 mil armas de fogo, que ainda fulminam a vida de inocentes. Nos últimos anos, inúmeros são os casos de pessoas assassinadas pelos tais CACs, (colecionador, atirador desportivo e caçador). Estes, ao que parece, têm “confundido” o objeto da caça. Caça-se gente, preferencialmente mulheres e pretos. Não faltam notícias de massacres na imprensa diária.
Na última quarta-feira (23/10), em Novo Hamburgo, região metropolitana de Porto Alegre, o atirador Edson Fernando Crippa, de 45 anos, que tinha histórico de esquizofrenia, atirou em doze pessoas, das quais matou três: seu pai, irmão e um policial. Com o atirador, a polícia encontrou farta munição: duas pistolas – uma de calibre 9 mm e outra de calibre.380 – além de duas carabinas. Armas compradas legalmente durante o governo Bolsonaro.
Em julho do ano passado, o Ministério da Justiça aprovou um decreto restringindo a venda de armas de fogo aos civis no país. Mas como convencer os atiradores ilegais a devolverem suas armas sem o necessário engajamento das secretarias de segurança pública?
Estados como São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Santa Catarina estão nas mãos de uma direita belicista. Defendem a tese estadunidense de que o cidadão tem o direito fundamental de possuir e portar uma arma para se defender. Mas não respondem à questão óbvia: como nós, os pacifistas, vamos nos defender de atiradores descontrolados? Quem controla os armados? Ao que parece, ninguém. As autoridades que deveriam gerenciar e fiscalizar as armas de fogo se omitem criminosamente. O Exército reconheceu que não sabe quantas armas existem em mãos dos CACs nas cidades brasileiras. O TCU constatou que o glorioso verde-oliva, que se arvora de uma eficiência que não tem, descumpre as medidas para controle de armas e impôs a todos nós as mazelas do descaso e do descontrole.
Mas há ainda outra arma, tão poderosa quanto às de fogo, a ser desarmada: a da ideologia fascista. Nos governos, tanto estaduais como municipais de extrema-direita, as pautas ideológicas vêm sendo implementadas, usando a estrutura pública que deveria servir ao cidadão. Escolas, creches e hospitais e, como acompanhamos recentemente, os Conselhos Tutelares vêm sendo instrumentalizados. Lembro, caro leitor, que em outubro do ano passado, a extrema-direita se engajou fortemente na eleição dos conselheiros.
Nessa linha, aqui, na cidade de São Paulo, mesmo antes do segundo turno da eleição municipal, integrantes do PL, partido da coligação de Ricardo Nunes, já negociam, segundo reportagem do site Metrópoles, uma nova divisão de cargos importantes da prefeitura. O PL de Jair Bolsonaro e do Coronel Mello Araújo (vice de Nunes imposto por Bolsonaro) estaria reivindicando a cobiçada secretaria da Educação. Uma pasta duplamente desejável para essa turma: além de sensível do ponto de vista ideológico, possui um orçamento de 23 bilhões para o ano que vem. Será o próximo capítulo de um desmonte já em curso. Nos últimos anos, tanto a saúde como a educação públicas, vêm sendo entregues a empresas prestadoras de serviço numa privatização perigosa e nada eficiente, com repercussões temerárias na formação pedagógica das nossas crianças e adolescentes e na saúde de todos nós. Isso sem falar nas escolas cívico-militares, que avançam a passos largos no governo de São Paulo.
É nesse cenário que muitas cidades, inclusive São Paulo, Cuiabá, Fortaleza, Belo Horizonte, Curitiba, elegerão no próximo domingo os seus prefeitos. Estamos, mais uma vez, diante da nada difícil escolha entre democracia e fascismo, entre a vida e a negação dela.