Adeptos armados e Exército como braço político. Estaria pronto o cenário para o golpe?
A dúvida é o tempo, mas a ação golpista que o presidente da República e seus aliados preparam para o Brasil, ao que tudo indica, está em curso e caminha para a realização. Dois fatos graves e significativos, nessa linha, deixam à mostra a iminência de uma ditadura mal disfarçada. Uma é a obsessão do tenente reformado que ocupa, hoje, o Palácio do Planalto, em espalhar armas de fogo pelos quatro cantos do País. A outra, o rasgar da máscara de uma fatia expressiva e belicosa do Exército Brasileiro, de uma hora para outra, transformada numa espécie de guarda pessoal de um presidente com pretensões autoritárias.
Armar a população não é bem a meta do presidente da República. Está em curso um processo criminoso de armar, aí sim, o seu eleitorado. É promessa de campanha e foi uma das primeiras a serem postas em prática, ou pelo menos foi tentado, logo ao raiar da tragédia política que contaminou o País a partir de janeiro de 2019. Duas motivações, igualmente não republicanas, acrescentam pitadas de perigo e sordidez a essa compulsividade de liberar armas para o povo que, segundo o seu messiânico presidente, “está vibrando” com a novidade.
Uma dessas motivações é o lobby literalmente violento da indústria das armas, notadamente “grifes” como a Taurus e Glock, defendidas com ardor pela “bancada da bala”, no Congresso Nacional, e pela própria família do presidente, amigos e assemelhados. Incluam-se nesse lobby, os milicianos, para quem está indo grande parte do armamento que passou a entrar no Brasil após a flexibilização de tributação e de fiscalização de revolveres, rifles e fuzis. Seis armas para cada brasileiro pode fazer um estrago de proporções imprevisíveis. Ou não é uma enorme cascata a tese de que as armas a mais estão servindo, de fato, a caçadores e colecionadores?
Outra foi a revelação de que o Exército Brasileiro se envolveu, diretamente, na trama política que mexeu de maneira decisiva no processo eleitoral de 2018, tirando do páreo um candidato a ele inconveniente e permitindo a ascensão de outro, calcado em um discurso de ódio, em fakenews e, empossado, um uma prática pré-ditatorial. A retirada estratégica do Exército de sua relativa neutralidade política, posição alardeadamente adotada pelas Forças Armadas após o período de 21 anos de ditadura militar, pode ter comprometido e ferido, talvez de morte, a Democracia brasileira.
Vale não esquecer que o Exército, hoje, integra o núcleo central do governo federal, em praticamente todas as áreas, a começar pela Saúde onde e ineficácia desses quadros não médicos responde, junto com o negacionismo científico irresponsável do próprio presidente, pelas quase 240 mil mortes provocadas pela Covid-19. O que pode acontecer com essa nova postura do nosso Exército é uma incógnita, lamentável e assustadora.
O que aconteceu, no começo do ano, no Capitólio, sede do Congresso dos Estados Unidos, quando um grupo de fanáticos invadiu o prédio numa ato insurrecional que deixou cinco mortos, com certeza mexeu com a imaginação dos bolsonaristas mais afoitos. Lá, os potenciais criminosos travestidos de militantes políticos e instados pelo presidente que se despedia após ser enxotado do cargo pelo voto popular, agiram de maneira semelhante ao que já vem sendo anunciado por aqui, embora mais contundentemente. Em Brasília, igualmente insuflados pelo presidente da República, promoveram atos antidemocráticos, chegando a soltar foguetes sobre o prédio do Supremo Tribunal Federal, ameaçando os ministros e familiares.
Sabe-se lá o que pode acontecer no Brasil com esses fanáticos bolsonaristas e trumpistas, acobertados pelo governo e legalmente armados. No Brasil, um episódio parecido com a invasão do Congresso americano pode ter desdobramentos ainda piores. Aqui, ao invés de gastar dinheiro comprando vacina e investindo no que deveria, o governo procura entupir seus adeptos de armas. Nos EUA, pelo menos mudou o presidente. Aqui, o presidente é o mesmo e age, cada vez mais, certo de que o país que inadequadamente governa é propriedade sua e que a Democracia é o inimigo a ser vencido.
O presidente conta com “seu povo” armado. Contará com o Exército? Institucionalmente, este precisa dizer se apoia tal plano ou não.